O Casulo de Mármore
Prólogo — Uma História Conhecida
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__A história começa da mesma forma como naquela que conta a paixão que o artista sentiu por sua própria obra. A beleza é uma tremenda armadilha, se não se aprende a encantar e encarar Afrodite.
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Parte I — O Solo Etéreo
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Eterna ao tempo
Olhar generoso
A musa que à forma se petrificou.
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Sonhando ansioso
De amores crescendo
Sedento, o homem que a ela criou.
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O dia nasceu
A musa morreu
E a obra ainda viva a calar,
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Sedado ao venoso
Em nuvens de gozo
Ao mundo deixou de contar.
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Nuvens não sustem a vida
Um dia, sustou.
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Parte II — Recluso À Concha
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Vieram seus amigos e chamaram pra sair
"Mulheres, das milhares, vais topar, é só partir"
Ouvindo ao umbigo, pensou antes de parir
As frases que respondem ao luar:
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Eis desgraçado destino, que foi me criar o mais belo ser
Que um dia, podia encontrar, mas que nesta vida, só assim posso ter
À noite em caçadas, com cartas marcadas, não ouso a ela deixar
Fico sozinho, a chorar de tristeza, mas forças não terei por lá
Por ter esculpido um amor, que a mim não mutuará.
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Em solidão foi crescido
E em solidão irá
Conhecer esta dor
De calcinação
Pois o amor foi pra si
Representação.
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__Muitas folhas dos mesmos ramos caíram, e diversas foram a vezes que o inverno as soterrou com seu gelo silencioso, para que depois viesse a aurora e enchesse de esperança o artista, que sonhava com uma fada encantada que tornaria seu fado justificado, animando a sua obra.
__Chorou muito por não ser viva, mas o tempo não esperou, e um dia, já envelhecido, acordou, e viu, horrorizado, a estátua, que, por acidente, ou causa desconhecida, havia tombado, e se partido em mil pedaços frágeis. Como aconteceria ao artista.
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Parte III — Chuva Salgada
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Desgraça maldita, esforço em vão!
Lágrima na areia, colheita do não!
Que faço agora, sem quem abraçar,
Sem onde apoiar-me pra mais me criar?
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Quão frágil a obra
Que a paixão sustentara
Quão frágil a vida
Que à paixão procedera.
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A modelo, já morta, não pode mais me nutrir
Morra, fada, que ao fado enfado tardou a vir!
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Quão frágil a obra
Que a paixão sustentara
Quão frágil a vida
Que à paixão procedera.
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Parte IV — Espelho Partido
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Desesperado atou de grão em grão
Os cacos do que restou esparramados ao chão
Uniu, perfeitos, como antes, quase tão
Mas era quase, o suor em vão.
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A face facetando buracos
Espelho quebrando em nacos
Fendas desenhando opacos
Coração e alma em cacos.
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Sete anos de azar a compor
No espelho, um mosaico da dor
Todos anos de azar a compor
Um retrato, um mosaico da dor.
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__De longe, ouviu alguém a suas exclamações, e este alguém logo foi ao seu socorro. Pois sabia aquela visita que a culpa, no fundo, tinha parte à sua travessura inconsciente.
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Parte V — A Criança Que Brinca
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Compreendeu sua dor, sem no entanto poder consolar
O filho da musa, que sentira no artista o declive
Sabendo onde fora enterrada, não poderia flechar
Pois Eros só atinge aquele que ainda vive.
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Sua vista é cinza, e não flore
Capta quem anda, quem cede seu ego
O alvo é quem inflama, colore
Pois, parado, o deus é mesmo cego.
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Quão frágil a obra
Que a paixão sustentara
Quão frágil a vida
Que à paixão procedera.
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Parte VI — Por Querer Lapidar, A Lápide.
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Gelado foi ficando o desgraçado que não ria
Pés, mãos, até que o corpo, por fim, suspira
Jogado ao campo, onde despedaçado jazia
Seu corpo, que, já duro, à estátua se fundira.
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Enterrou-o sozinho o filho de sua musa
E fizera de sua lápide os cacos da obra
Pra que dos restos da arte sinalizassem a recusa
Que o artista fizera, chamando, a tudo, de sobra.
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Não deixou filho, compensarei aqui com uma a árvore
Pois também se quebrou sua obra, e eras tu o mármore.
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Parte VII — O Remorso Da Paixão
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__Um recado deixou o deus ao pé da muda da videira que plantou próximo ao mosaico, e serviu de epitáfio ao pálido criador.
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Fui eu quem quebrou a estátua, pois a atingi com minha flecha
Fui eu a fada de teu fado, que, por loucura, assim desfecha
Tu, que tanto me louvaste, achei de uma chance merecedor
Mas não pude animar a tua obra, pois animado estaria tu em flor
Não te quis quebrá-la, mas não medi forças
Só quis que tivesse nela o amor de todas moças
Pra que parasse de chorar, pra que parasse de sofrer
E voltasse a falar, de mim, pra todos ver
E nutrir em ti, tu mesmo, em fonte.
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E se um dia achares no direito de a mim vingar-te, serei honrado.
Mas só aceitarei a fúria, se matar-me em arte, a ti representado.
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Parte VIII — A Compaixão Dos Mortos
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A causa da tragédia fora descuido do criador?
— Por negligência deverá sofrer em eterna dor.
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Ou fora o vento de Hermes o destruidor da escultura?
— Então uma mensagem não chegou à estrutura.
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E se fora um animal selvagem que a derrubara faminto?
— Não seria digna de ser bela, por não vencer o instinto.
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Quão frágil a obra
Que a paixão sustentara
Quão frágil a vida
Que à paixão procedera.
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Homem sofrido, levanta e me ouve
Tu me criaste a mais linda que houve
E agradecer eu teria que também
Se não fosse um porém.
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Tu és o último a supor-me fato perfeito
Visto que fora causa da queda ao seu leito
Entenda que crias, eu nasço e amém
Não me prive do além.
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O mármore é minha forma, mas não a minha alma
Eu tenho tu em mim, mas não tenha a mim em tu como ferida
Minha alma tinha sua semente, sua flora, sua fauna
Eu voei, saí para a eternidade, e não entendeste que eu criara vida.
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Parto no seu parto
Mas foi por ti, pai enciumado.
Parto, mas não aparto
Porque sou ti, deus de seu fado.
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Parte IX — Não Se Captura Estrelas
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__A alma da musa, visitado seu vetor, despediu-se, até quando os destinassem o tempo, mas sem antes deixar no céu uma mensagem.
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Alçado o vôo, explodiu-se em mais mil pedaços
Espalhando-se por todas as terras seus estilhaços
E inclusive sob a face daquele que estava a chorar a véu
Mas já soluçante, contorcendo sua mão, apontando ao céu.
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Quão frágil a obra
Que a paixão sustentara
Quão frágil a vida
Que à paixão procedera.
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Epílogo ou Parte X — Casulo de Mármore
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Dali se foi, voltou a dor
Trouxe a cruz, o choro e a luz
Mas levantou, alado em jus
Voar pra lá, pro seu amor
Que nada é senão criar
Que a viver, que respirar
O Exo rompeu, e a ele viu
Livre do corpo que o pariu
Pois tua maior obra é
Pois tua maior obra é
O choro e a luz
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Que nada é senão criar
Que a viver, que respirar
O Exo rompeu, ele cresceu
Livre de quem o concebeu
E encantou, polinizou
E inspirou, ali cantou
E não temeu, e não tremeu
Pois tua maior obra é
És tu.
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Pois tua maior obra é
És tu.
encontrada perto a regiões
de atividas vulcânicas.
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