25 de janeiro de 2005

Exclamações e reticências.

Estou na rede da varanda. Estou vazio como um poça d’água na estrada. O vento lambe meus pés, mas não sinto nada. Uma inércia, suspenso pela rede, mole como areia no relógio. Nada, nada.

Mas queria sentir.

É uma ilha, um morro, arfar de árvores, tilintar de sininhos, daqueles de porta. Lá no fundo, a cidade corta a negritude do horizonte sem lua com luzes enfileiradas de formiga. Civis que cortam a terra. Tênue pra quem vê de longe; pra de perto, “uau!”.

Uma cadela me vigia. Deitada, encolhida, com as sentinelas negras e as pálpebras arqueadas, bem atenta e meus passos.

Eu não ando.

Sou estranho àquilo tudo. Se piso na terra, o graveto denuncia; se finjo estar bem, o vento quebra o galho e me assusta. Assusta, pois sou estranho e me soa estranho. A calma.

Mais arfares; o vento não deixa, mas não me entra em mente. Eu penso nada. E nada não nada; eu flutuo na dúvida; sobre a minha dúvida; a questão sobre a questão: por quê? Quem está aí?

E o vento não liga a mínima; devolve a pergunta.
— Quem está aí?

Há uma torcida lá fora; lá fora aqui do lado. Gritam “olé” com os ares que passam e me driblam de mim.

Quem estou aqui?

Ooooooooooooooooo... lê...

Tento pegar um pensamento. Mas a bateria da torcida, de sinos de porta:

Tlin.... tliinnn... tlin....

Começa a dar agonia. É muita calma nessa hora. Eu quero pegar a folha, pegar a tinta; e verter algum líquido deste vaso, seja água e seja vinho. Dou tapas na perna, mas não há mais moscas; eu não me sinto mais.

A calma de enerva. Mas em outro plano; eu ainda estou na rede; pego pelo silêncio sem sono.

E a ilha pergunta:

— Que estás fassendo?
— Estou... escrevendo?
— Pois solta!

E o turbilhão levou as folhas das mãos.

— Volta! Volta! São meus!
— Senta... e sinta!

E deixei verter para dentro.

— Aqui não há metro, mas tudo rima. Sem polisentido, mas nada é tudo. Tu se sentes a mancha no vazio, mas aqui nós somos a mancha, e tu és o vazio. A tua forma está, mas as cores se invertem. Pare de pensar. E observe.

Ooooooooooooooooo... lê...

Tlin.... tliinnn... tlin....


E deixei de buscar o que escrever. Dessa vez, a natureza era água; sem gosto, sem cheiro, sem grandes sensações das que eu costumava saber. E vi que minha busca não era mais por vinho, e era sim sede, desidratação.

Eu bebi; mergulhei. A tosse da cidade passou. A ânsia amainou; os monstros que se mechiam ao redor agora dormem e andam. A cadela adormeceu. A gaia absorveu-me.

E eu tirei férias das exclamações, adjetivos; para curtir as reticências.

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