20 de setembro de 2007

Esterilismo

Em falta

A véia Iá
Da Bahia
De famia
Empregada há mais de tem
Fazia um pastel que dava gosto

Seus "neto"
Borrados da terra
Do jardim da sua casa véia
Falavam da escola
Com a boca cheia do pastel que Iá fazia

A mãe reclamava
Do pastel molhado
Não era saudável
O nham da Iá

Os moleques não ligavam:
A gorda era farta
E os netos só enfartavam
Queimando no jardim da Iá

Os moleques cresceram
Boas notas tiraram
E se foram
Pra onde os pastéis
São mais secos
Como o ar que entra
Pela grade de seus ares

Enquanto, a TV ligada
Na cozinha a véia:
Dona Iá faz pastel
Distrai da programação.



Modas

Na arenosa
Velhos em cavalos
Pais e filhos
Lutam a tradição

Mas
De onde tradição?
De onde vêem?

Os dançarinos
Os figurinos
Sejam obrigados
Sejam graciados
Tão o número
(que é número, pra mim)
Como se fosse o infinito
E assim a arte se trança
Sem as barras listradas

Eu, de roupa de marca
Eis que mais marca
O trapo dançante
Dos palcos marginais

Não entendia o chiado
Mas dizia: de onde vêem?
E por que tão siglamente
Se trepam
Se trapam?

Esses trapos
Vestes mágicas
Revelam São Paulo
E rasgam no povo
A memória esquecida.


Esterelismo

Caixa eletrônico
Baixa automática
Gravadora de replay
Creme anti-rugas
Ares condicionado
Inspiração condicionada
E remédio pra remediar o remédio
E produto pra produtar pra tudo

Enquanto a cidade
E a -lização
Constroem prédios
Pobres constroem barracos
E o concreto
Estreliza

E-mail
E-commerce
E-nviromment
E-is
E-x

E-daí?

Que cultura é tal
Que desaba cabanas
Que nos assepseia
E nos tira os velhos
Das cidadelas
De trapos tão vivos?


Marcas

Disseram-nos proibidos
Um, branco e cabeça
Outra, víscera e linda

O que um choqueia n'outro
Nem os trapos diriam
Nem as roupas de marca
Mas os trajes ao chão.

E mesmo poliviciados
Dentro do dável
Semeamos os arfos

Foi quando lembrei
E fui comer na Iá.


Perecíveis

De onde, tais culturas?
De onde vestes, como juras?
Cá a ducação
Nos assenta na beleza
No brilho, no saudável

E tal assento
Não prepara
Pro quarto dum velho
Que em últimos dias
Nos causa ânsia
Do cheiro forte
E a pele caindo

E nós, que dissemos
Amar o velho
Caducamos
Neste amor pasteurizado

Sinhá Iá tava magrela
Pegou doença fedida
E os moços conversam com panos
Cloroformados
Para ouvir a véia falar

Dona Iá sorri
Tosse o rim
É quando surge um compromisso
De prevenção
Que puxa os moços
De olhos marejados
Pro ar puro
De seus carros

Não faz Iá mais pastel
Aquele ruim, mas bão

Quem matou a véia
Foi a pasteurização
Dona Iá caiu sozinha
Sem ter passado em livro
Sem pagar a resenha
Nem posto em exposição.
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5 comentários:

Bebê disse...

tá em fase de transição?
muito interessante, sempre.
preciso ler de novo


tenho post novo!
e acho que também estou em fase de transição. de repente, comecei a fazer poesia!

de repente, não mais que de repente

hahhahahah

to feliz. eu não fazia.

Bebê disse...

comente, porque esses últimos eu não sei se estão bons, e eu gostaria de ler suas opiniões sobre minha nova fase.

Mochileira Incurável disse...

saudades deste claucio...

Anônimo disse...

Lindo, muito lindo.

Mainá disse...

O conflito é sempre muito fértil, é processo, não o fim, e é bonito. Pois vejo enfim que agora o Claucio brinda comigo a vinda de uns orixás, e surgem, surgirão novos conflitos para novos frutos. Adorei, aliás, tenho adorado fuçar no seu blog!