10 de julho de 2005

Palavras Covardes.

Deveria ter dito, mas não disse. Minha mãe sempre recomendava: espera a tormenta passar para poder abrir a boca. E o que ela diria da tormenta ígnea da paixão não revelada? Daquela angústia que cegava entorpecentemente, que nivelava o ser de 20 convicta a uma criança de 10 inocente? — Eu segui os conselhos de minha mãe. Hoje, o que restou é cinza. E arrependo-me profundamente. Nunca mais seguirei seus conselhos.

A quem eu deveria ter dito, há muito tempo:
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Diante dela, que no meu coração de lupa é maior que todas as nações e causas coletivas, não há palavra que expresse a admiração, encantamento e medo, ou palavra que absolva este corpo que vacila — olhos, mãos e lábios trêmulos, e voz que põe em evidência minha falta de dicção. As palavras salvarão este corpo que cai perante sua magia e sensualidade?

Até os órgãos discordam entre si. A cabeça desvia, o olhar volta. O tronco balança, os membros se seguram. O pulmão, que precisa respirar, e o coração, que precisa correr, são contra a nave-mãe, o congresso do cérebro, que, por tradicionalismo, é da turma do deixa disso. A maior guerra ocorre aqui dentro, entre as forças revolucionárias e os partidários conservadores.

Aproveitando uma falha da defesa dos dominantes
uma distração causado pelo provável estresse que as rebeliões implodem um sinal foi enviado do lado direito do cérebro (o não-racional) até a língua, e o sinal fugiu dos lábios e foi arremessado (a língua nem sempre sabe discernir) de encontro ao quem sabe. O sinal era uma palavra que desafiou a autoridade do sabido e temido, da ditadura social, e abriu suas asas em direção àquela que era estopim para a intraguerra. Linda.

A palavra soou solitária: Linda.

Mas foi como uma pedra arremessada ao muro. Por ter aquela beleza incógnita, e aqueles olhos carentemente disfarçados, e aqueles fios de cabelo timidamente presos, era de esperar que à palavra “linda” já existisse uma resistência. Por costume. Sim, com certeza. Muitos já devem ter dito. Desde os que, como eu, são encabulados, até os exércitos melhor comandados e de palavras mais experientes. Sim, já deviam ter lançado suas tentativas à esfinge em busca de seus tesouros escondidos.

Mas a tal palavra tornou-se heróica. Assumiu a honra de seu dono — o reino, não seu reinante — para morrer em luta. Ela foi, e voltou dura, mas saltou novamente e tentou cada vez mais crente, e, por isso, houve uma saraivada de dicionário pobre: Linda, linda, linda!. Uma heroína, que tornou-se, assim, superior, justamente por ser a primeira a agir.

Tocadas pela coragem, pouco depois algumas outras palavras — companheiras, mas que às vezes não convêm — saíram para auxiliá-la na causa e luta. Como, você, é, linda, ou Linda, como, nunca, senti, ou Apaixonantemente, linda.

E por aí foi. Aos poucos, graças ao furor causado pela impressão da barreira que nanometricamente foi transposta, multidões de palavras — agora nem sempre selecionadas — se jogaram, armaram sua estratégia e se lançaram àquele ser que finalmente começava a demostrar reação. O muro sentiu cócegas. Até feudos, antes nem tanto motivados, como o da astrologia, do cinema e dos assuntos-cabeça, se organizaram e enviaram seus pequenos exércitos em prol da conquista verbal. O final disso tudo? Cada caso é um causo.

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Nem sempre o muro é derrubado. Nem sempre existem ninfas apaixonadas esperando do outro lado. Mas a beleza da batalha faz o peito respirar fundo, a cabeça direcionar-se, os olhos se fixarem, o coração fluir em veias quentes, e os mandantes do reino até se calam e deixam escapar os prisioneiros da paixão, que pulam, dançam, sorriem nesta condição de liberdade momentânea. Um arsenal que faz o 8 pular para o 80.

E agora até os tradicionalistas se convencem da necessidade do embate constante a cada Linda conhecida. Não pela razão de conquistar o outro lado, mas por reconhecer que o estado de equilíbrio deste lugar só é alcançado com a união de forças na ação pela mais bela causa: dizer, de todas as formas desejadas, a quem mereça, com ou sem mérito, aquilo que neste mundo mais é Linda.


A lava lava. A explosão torna-me puro aos olhos de meu auto-comitê.

Um comentário:

Anônimo disse...

Volto aqui sempre pra te ler. Beijos, V