31 de julho de 2007

E agora, Luís?

E agora, Luís?
A festa acabou,
o ar apagou,
o povo caiu,
o vôo não freou,
e agora, Luís?
e agora, nós?
você que é só nome,
zombava dos outros,
fazia seus gestos,
discursos, protestos?
e agora, Luís?

Está sem colher,
está sem discurso,
campanha carinha,
já não posso escolher,
já não posso voar,
despir já não pode,
a noite esquentou,
o deputado não veio,
o juiz não veio,
o gozo não veio
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, Luís?

E agora, Luís?
Sua dofe palavra,
seu instante de febre,
sua gula e banquete,
sua biblioteca,
seu banco de couro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
fecharam;
quer morrer no mar,
de dinheiro;
quer ir para minas,
Abre um bordel.
Luís, e agora?

Se gritasse,
se gemesse,
se tocasse
a gente não assistisse!
Mas deita,
mas dorme,
Se pelo menos se morresse...
Mas a gente não morre,
você é mole, Luís!

Sozinhos no escuro
qual bicho-do-mato,
com demagogia,
tal democracia
para nos encostar.
De carro preto
que fuja de golpe,
você nos guia, Luís!
Luís, para onde?
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Disputas, dez putas, déspotas.

— Seu delegado, denúncia de puta.
— De puta?
— De puta.
— Puta é quem?
— Denúncia de jornalista. Sobre puta.
— Homem ou mulher?
— Mulher.
— Que puta!
— De puta a puta.
— Prenda.
— O cafetão?
— Não. A puta.
— A puta?!
— A puta da jornalista.
— Por que a jornalista?
— Porque não pode.
— Puta?
— Dedar putaria.
— Puta...
— Pode ser bandido. Puta, não!
— Por quê?
— Puta não apita em puta.
— E quem apita?
— O juiz.
— Que é filho dela?
— Não. O juiz, que come a puta.
— Da jornalista?
— A puta-puta!
— Ela fica puta.
— E aí me imputa.
— E disputa.
— E não se vende por um puto!
— Manda à puta que pariu?
— Não, que ela denuncia.
— Então, longe de puta?
— É. E limpa a denúncia.
— Dela?
— Da gente.
— Não era da puta?
— Sim, mas também me desimputa!
— Entendi.
— Nunca vi puta. Nunca vi puta.
— Amanhã tu é home desimputado.
— Faz direito, que tu vira deputado.
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17 de julho de 2007

A fonte da Praça da Fonte

Foi quando, para trabalhar, eu sentei à mesa da sala, esta sendo plataforma para as grades da janela, através da qual vi e ouvi na rua um carro com gramofone anunciando a inauguração da fonte da Praça da Fonte.

__"Venham, venham participar desse marco na comunidade osasquence."

__Afastei a mesa, as cortinas e o vitrô. O fúlgido sol, primaveril de outono das dez horas que reluzem na praça verde-viva iluminada, me deu aquela cegueira de tatu que erra o caminho e encontra o céu. E vi, a um telhado distante, na rua e na calçada, um punhadinho de velhotes se aproximando, curiosos, àquele raso poço um por dois metros cheio d'água, d'água que vertia de um pequeno encanamento surgido entre o jardim improvisado, e que cintilava conforme a hora, que nos era agora.

__Há uma semana que um trator cavara aquele retângulo na grama. Pedreiros forraram com pedras seus contornos, e os encanadores puxaram, de algum canto escondido, a fonte. Fonte que existira, que outrora dera nome à praça, e que sumira ninguém sabe como, para muitos anos depois ressurgir graças a uma obra politicária ou de movimentação social — e a resposta à dúvida eu não sei qual é.

__Estava terminada a revitalização da famosa pracinha, e a pincelada final fora chamar os velhinhos, antigos moradores do bairro e únicos ativos no movimento de preservação da comunidade, a comparacerem à inauguração da fonte da Praça da Fonte. Os mais tímidos, que são os caducos ou as donas de casa, ficaram, de suas janelas, chamando as empregadas, apontando aos quinze presentes que cercavam a pequena — mas simpática — fonte que fora trazida para alegrar, ainda um pouco, mais aquele que é um dos símbolos do Jardim D'Abril de Osasco.

__Eram bonitas dez horas, e, se não fosse o evento, eu poderia ter ouvido apenas uns dois ou três moleques que jogam bola todo dia no mesmo horário no campinho, que quase fica em frente a minha casa. Naquele horário o silêncio de interior pode provocar de tudo, mas depende da combinação que se faz no clima. Com sol, o dia fica diamante, a praça reflete e oxigena, e cora, sem sombra de concreto a apagar os matizes da manhã. Com chuva, a praça reflete; não a luz, mas o sentimento pensado, pois a rua é inclinada e por ela a água corre, corre e nos traz o sono. O nublado no clima de interior nos traz o silêncio da ausente vontade guardada em casa, e o tempo se demora, até que, pumba! na cama mesmo sem o sono da chuva interiorana.

__Mas hoje era dia de se dar bom dia. E eu fiquei da janela, dando o meu, aos velhinhos que andavam de pé em pé, devagarinhos, pela grama, a comentarem os passarinhos e o chí da água corrente da fonte. A água corrente purifica, e a inauguração da fonte, anunciada pelo gramofone, e ajuntando toda a sabedoria bairrista em torno da jardinzinho, de certo jeito purificou o bocejo, trazendo a gostosura, de qualquer tempo, que é escrever todo dia ao lado da renascida fonte da Praça da Fonte.
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